Sigo firme na minha maratona dos filmes indicados ao Oscar. No último sábado assisti ao lindo trabalho do diretor Todd Haynes, “Carol”, protagonizado por Cate Blanchett, que dá vida à personagem-título, uma mulher rica em processo de divórcio do marido Harge Aird (Kyle Chandler), e Rooney Mara, a qual interpreta a jovem Therese Belivet, operadora de caixa numa loja de bonecas e fotógrafa nas horas vagas. A produção é uma adaptação do livro “The Price of Salt”, escrito por Patricia Highsmith, nos anos 50, mesma época em que o longa é ambientado.
A história de amor entre as duas mulheres acontece em uma época em que a homossexualidade era considerada doença, o que força as duas a reprimirem o que sentem uma pela outra, ao mesmo tempo em que se torna mais difícil esconder o desejo. Por boa parte do filme, a atração entre elas é expressa através dos longos olhares e dos gestos, que dão a beleza e a delicadeza do longa.
Desde o primeiro momento, Therese observa a elegante Carol em um misto de admiração e mistério: há algo naquela mulher que a intriga e desperta sua curiosidade, enquanto a segunda possui um olhar de quem sabe o que quer e está bem em frente a ela.
Tanto Cate Blanchett quanto Rooney Mara estão ótimas em seus papéis, mas é a segunda quem mais se destaca com sua personagem tímida e retraída, embora corajosa e disposta a entender aquilo que vem sentindo pela mulher que a convida para uma viagem pelo interior dos Estados Unidos. Conforme o filme caminha, a tensão sexual entre elas fica cada vez mais palpável e nem as restrições sociais conseguem frear a paixão intensa entre as duas.
O conflito se dá pelo marido de Carol, Harge, o qual não aceita o divórcio e ameaça tomar a custódia total da filha para ele, invocando uma “cláusula de imoralidade”, pelo fato da esposa ter dormido com alguém do mesmo sexo. Isso a destabiliza e a faz aceitar um tratamento psiquiátrico para comprovar sua sanidade mental.
Caso a história se passasse em 2016, Carol e Therese poderiam ter vivido o relacionamento de forma aberta, tendo ainda a possibilidade de casarem-se e construírem sua própria família. Isso me fez pensar no quanto caminhamos nesses mais de 50 anos desde a história do filme: o casamento entre pessoas do mesmo sexo tem sido aprovado em mais países, o movimento LGBT tem conseguido mais visibilidade para suas pautas, paradas do Orgulho LGBT acontecem em diversas nações; tudo isso num tempo em que “sair do armário” ainda envolve um grande conflito interno, famílias compostas por dois homens e duas mulheres nem sempre são reconhecidas, homossexuais não podem doar sangue, a demonstração de afeto na rua, na televisão ou no cinema ainda é alvo de piadas, fora a violência física, que tem tornado o Brasil, por exemplo, campeão na morte de LGBTs.
“Carol” é um belíssimo filme sobre a história de um amor proibido em 1952, e que ainda encontra resistência cinco décadas após o lançamento do livro da escritora Patricia Highsmith, a qual utilizou um pseudônimo para poder contar uma história com final feliz para as duas mulheres, o que ia contra o padrão da época, quando homossexuais eram mortos ou curados através do amor de um heterossexual em obras literárias.
Talvez o que mais tenha me chamado atenção no longa seja justamente a aproximação do tema com os dias de hoje. O presente se mistura com o passado e nos lembra como amar continua um ato revolucionário.